Fechando o lançamento dos DVDs da série clássica com chave de ouro, a coletânea Saint Seiya — The Movie Box chegou ao mercado no dia 6 de agosto de 2004, reunindo os 4 filmes apresentados ao público na década de 80. Tal qual os 5 volumes anteriores, a caixa trazia um manual com informações inestimáveis dos bastidores dos filmes. O livreto continha os detalhes do processo de confecção dos 3 médias-metragens e do longa, as fichas ilustradas dos personagens, a discografia e todos os dados filmográficos das produções.
A Tōei Video também contemplou os fãs com os depoimentos do senhor Kōzō Morishita, diretor de núcleo do seriado e do primeiro filme, do senhor Shigeyasu Yamauchi, diretor a cargo de A Grande Batalha dos Deuses e de A Lenda dos Jovens Carmesins, do senhor Masayuki Akehi, que dirigiu Os Guerreiros do Armagedom, e do incomparável maestro Seiji Yokoyama, autor da trilha sonora de todos os episódios e filmes da série.
Detalhes das Produções
Tal qual o mangá de Masami Kurumada, a animação televisiva Saint Seiya (1986-1989) se tornou uma das produções icônicas dos anos oitenta. O primeiro filme original estreou cerca de nove meses após o início da difusão, no período ideal, exatamente quando as coisas estavam para pegar fogo. Em outras palavras, pouco antes da “Batalha das 12 Casas”.
A direção ficou a cargo do senhor Kōzō Morishita, o diretor de núcleo da série de TV, e o enredo, do sr. Yoshiyuki Suga, roteirista de diversas produções cinematográficas de animes da Tōei, a exemplo de Akuma-Kun (1989), Magical Tarurūto-Kun (1991) e Slam Dunk (1994).
O senhor Suga, que participava da série como um substituto eventual do senhor Takao Koyama, da composição, desempenhou um papel de suma importância na produção, sendo responsável por várias histórias originais do seriado e por 3 filmes. Posteriormente, ele acabaria se encarregando de B’TX (1996), outra produção do senhor Kurumada.
O filme também arregimentou os membros do estafe principal da série de televisão, como o senhor Shingo Araki, na direção de animação e character design, e o senhor Seiji Yokoyama, na trilha sonora. O senhor Araki acabaria trabalhando em 3 filmes, encerrando sua participação em A Lenda dos Jovens Carmesins, ao passo que o senhor Yokoyama se engajou na produção de todos os filmes de Seiya.
Para a concepção dos personagens antagonistas, o diretor Morishita e os produtores Yoshifumi Hatano e Masayoshi Kawata se congregaram em Izu Kōgen. A fim de evitar que os inimigos se tornassem meros “bois de piranha”, foram dadas a eles personalidades e armas correspondentes às dos heróis.
Os vilões, por sinal, eram liderados por Éris, a deusa da discórdia, que também aparece nos mitos da Grécia. Trata-se do mesmo ser que utilizou o pomo de ouro para deflagrar a cizânia entre Atena e outras duas deusas (a propósito, Éris também é a gêmea secundogênita de Ares, o deus da guerra).
Além disso, a luz emanada da maçã dourada, que haveria de se tornar a chave da história, utiliza efeitos especiais como o da propagação luminosa de câmeras estenopeicas, técnica empregada nas cordas de Orfeu.
Dando-se a luxos como a regravação da trilha sonora por uma orquestra completa, o filme consumiu um orçamento extraordinário para os padrões de uma produção do Tōei Manga Matsuri.
O segundo especial da série, A Grande Batalha dos Deuses (1988), estreou na primavera do ano seguinte. Com o período de lançamento coincidindo com o clímax da Saga das 12 Casas, mais do que nunca, os fãs de Kurumada e de Seiya de todo o País voltaram sua atenção à animação.
A direção foi delegada ao senhor Shigeyasu Yamauchi, que já havia trabalhado na direção de episódios como o trigésimo capítulo, O cosmo flamejante do amor*. O roteiro, por sua vez, ficou a cargo do senhor Takao Koyama, responsável pela composição da série semanal.
No filme, aparecem personagens da mitologia escandinava como o filho dileto de Odin, Balder (Dorbal), Loki, Ull e os irmãos Freyr e Freya (Frea). Como no mito, o martelo Miollnir empala o corpo de Hrungnir (Rung), e Freyr acaba perdendo a vida por uma mulher. Também é desnecessário dizer que esta obra serviu como protótipo da produção da “Saga de Asgard” para a TV.
No verão do mesmo ano, foi apresentado ao público o terceiro filme, Saint Seiya: A Lenda dos Jovens Carmesins. A despeito de ser o primeiro longa-metragem da animação, como o projeto foi chancelado em fevereiro, trata-se de um trabalho produzido em apenas 5 meses (dizem que o diretor recebeu a demanda do produtor executivo, Hiroshi Takeda, no dia da primeira exibição privada de A Grande Batalha dos Deuses).
Seguindo o trabalho anterior, o sr. Shigeyasu Yamauchi continuou na direção, ao passo que o senhor Suga reassumiu o enredo. Desenhadas pelo senhor Araki, a graciosa aparição de Abel e a ressurreição de Saga e dos demais cavaleiros dourados acabaram virando assuntos obrigatórios entre os fãs.
Uma música-tema original foi composta para este trabalho, e, após uma audição, a cantora Hitomi Tōyama foi escolhida para interpretá-la.
O último filme produzido durante a difusão do seriado, Os Guerreiros do Armagedom, foi lançado em março de 89, quando a série entrava em sua etapa final. Considerando que o Seiya da TV ainda estava no Templo Submarino, os cavaleiros de bronze acabaram derrotando Posseidon um pouco antes no filme.
Para fechar as cortinas do show, o produtor Hatano convocou o diretor Masayuki Akehi, uma parceria que remontava a Ken, o Menino-Lobo (1963). Diretor dos episódios 15, 32, 56, 86 e 107 da série de TV, o senhor Akehi mantinha uma estreita relação com os capítulos protagonizados por Ikki, razão pela qual seu desvelo para com a representação do Cavaleiro de Fênix também foi incutido na direção desta produção (vide entrevista na página 13).
Como o senhor Araki, que se encarregara da animação dos 3 filmes anteriores, devotava todo o seu empenho ao epílogo da série de TV, a supervisão da animação e o character design foram confiados ao senhor Masahiro Naoi.
Além da parceria sacramentada nos episódios 15, 36, 41, 56, 86 e 96 do anime, o senhor Naoi trabalhou com o senhor Akehi em várias produções da Tōei, a exemplo de Hokuto no Ken (1984) e Slam Dunk (93).
Em consonância com o teor da obra, foram encomendadas ao senhor Yokoyama melodias com forte conotação religiosa e, para marcar a conclusão das longas batalhas, foi composta para o encerramento uma canção que refletia a Sinfonia do Novo Mundo, de Dovrak.
Com essa produção, a versão animada de Saint Seiya chegou ao fim da linha. Por enquanto, era o fim do espetáculo. Contudo, os filmes e a série de TV continuaram guardados nos corações dos fãs, e os sentimentos dessas pessoas finalmente culminaram na realização dos OVAs de Hades: A Saga do Santuário (2002) e na produção do novo filme, Prólogo do Céu (2004).
Bibliografia:
Saint Seiya Anime Special (Shūeisha),
Saint Seiya Cosmo Special (Shūeisha).
Entrevistas Especiais
Kōzō Morishita — Diretor de Éris, a Deusa Maligna
“Deixamos o conteúdo simples, fácil de entender; nos devotamos de corpo e alma à fotografia e à colorização.”
Por ser o diretor da série de TV, eu tive o privilégio de também me permitirem dirigir o filme. Eu não me recordo mais dos detalhes da produção, mas acho que o filme foi planejado para popularizar ainda mais o já famoso Seiya.
Com a novidade do filme, a motivação do estafe subiu, e, como a verba do orçamento também saiu, pudemos nos dar ao luxo de realizar extravagâncias.
Tencionando fazer algo absolutamente fascinante, utilizei toda a tecnologia que havia na época. Contudo, como gastei muito dinheiro, fui repreendido pela companhia, sabe… (Risos.)
E, numa época em que não existiam os recursos da computação gráfica, o processo fotográfico também era monumental. Como aumentamos o número de desenhos em relação à versão televisiva, acredito que o pessoal do acabamento também passou por maus bocados.
Em contrapartida, simplificamos o conteúdo por haver uma ênfase na ação. Afinal, como eu fazia a série desde o seu primeiro episódio, já estava careca de saber o que dava mais resultado.
Em suma, a fórmula diz que, não importa o que aconteça, depois de ser completamente massacrado, o Seiya — sozinho — finalmente se levantará e derrotará o inimigo. (Risos.)
É a receita dos mangás da Shōnen Jump, que orbita em torno do lema “amizade, superação e vitória”, não é mesmo?
Usando outros mangás e live-actions como referência, engendrei a ação que seria convertida em desenho. Fazer os cinco aparecerem no tempo de duração do filme foi complicadíssimo… Eu mesmo penso que fiz um ótimo trabalho para 45 minutos, hein? (Risos.)
O grande momento é mesmo a última cena, o trecho em que começa o cântico da senhora Kawashima (Kazuko). Afinal de contas, o senhor Yokoyama (Seiji), da trilha sonora, deu o seu melhor, e a mixagem se entregou de corpo e alma.
De todo modo, o processo fotográfico, a transmissão luminosa, o método de utilização das sombras… a meu ver, é um trabalho que, mesmo visto hoje em dia, não denota o peso de sua idade, não acha?
8/6/2004 — depoimento concedido no escritório central da Tōei Animation
Ficha
Natural de Shizuoka, nasceu no dia 17 de julho de 1948. Iniciando sua carreira na direção em Cutie Honey (1973), concentrou-se em animações de robôs, como Kōtetsu Zieg (1975). Em Saint Seiya (1986), exerceu as funções de diretor de núcleo e produtor (a partir do episódio 61). O planejamento da série Devilman (2004) foi seu trabalho mais recente.
Shigeyasu Yamauchi — Diretor de A Grande Batalha dos Deuses e de A Lenda dos Jovens Carmesins
“O que eu queria retratar em Seiya era a devoção sectária de Seiya por Saori.”
Como o filme do senhor Morishita foi uma bola reta, permitiram que eu fizesse o meu por meio de uma bola curva. A parte basilar, “a figura dos cavaleiros que protegem Atena”, é a mesma, mas eu a retrato salientando o “sentimento de Seiya por Saori”.
Em A Grande Batalha dos Deuses, decidi que o inimigo (Dorbal) mostraria seu verdadeiro caráter ao ser interpelado por Saori. Isso aconteceu porque eu queria fazer com que Saori, que normalmente não está em posição de lutar, confrontasse o inimigo.
Depois disso, na cena em que o Shun procura Saori, o close se converte numa tomada longa no exato instante em que o rosto da deusa é exibido. O fato é que eu mesmo não costumo usar este tipo de direção, mas, ao ser levado pelos esforços desesperados do Shun, sem querer, acabei me empolgando no storyboard. (Risos.)
Posteriormente, na sequência em que Andrômeda é dilacerado junto com o chão e tudo pelo Ull, até calculei o tempo da queda e a altura do rochedo… Eu tenho essas memórias.
O que gosto em A Lenda dos Jovens Carmesins é da abertura, sabe? Foi bom poder retratar Saori como uma menina.
Por haver uma regra que diz que o lado da justiça é o direito, no apogeu, nas cenas em que Pégaso arma o arco, não importa o que se faça, acabamos impossibilitados de enxergar o seu rosto. Então, entre outras coisas, eu elaborei o esquema de girar a câmera para que o Seiya pudesse ser visto galantemente.
Quanto àquela cena em que a flecha de Sagitário corta o ar, no storyboard, a seta acaba chegando ao destino em cerca de 1 segundo. Como a achei insípida demais, implorei ao senhor Araki que a expandisse para mim. Eu sinto muito por aquilo… (Sorriso de embaraço.)
10/6/2004 — depoimento concedido no Parque do Templo Zenpuku
Ficha
Data de nascimento: É segredo! (Risos.) Estreou na direção em Arrow Emblem Grand Prix no Taka (1977). Em Saint Seiya, além dos 2 filmes mencionados acima, dirigiu os OVAs de Hades, a Saga do Santuário (2002) e o filme Prólogo do Céu (2004). Seu último trabalho foi Ojamajo Doremi Na-i-sho (2004).
Masayuki Akehi — Diretor de Os Guerreiros do Armagedom
“É que o Ikki de Fênix é um homem como o Ken (Takakura).” (Risos.)
Como era um filme voltado totalmente ao público infantil, eu busquei uma história de fácil compreensão. O tema é a “união de protagonistas singulares em torno de Atena”.
Para começar, no intuito de fazer dos antagonistas inimigos dignos do último filme, eles sideraram os cavaleiros de ouro num piscar de olhos. Ainda que, depois disso, tenhamos feito uma cena apoteótica com eles. (Risos.)
Eu fiz Atena percorrer o excruciante caminho de espinhos passo a passo, sem que fosse capturada, porque queria expressar a sua disposição para proteger a humanidade a todo custo, mesmo que tivesse de se imolar.
No clímax, a fim de ampliar o highlight, eu me certifiquei que, a despeito de ter envergado a armadura dourada, Seiya não pudesse alvejar o inimigo de imediato. E também a cena em que a flecha trespassa a estátua de Satanás… Eu me recordo que a inseri depois, como uma sequência adicional.
Em seguida, o que demandou muita ponderação foi a forma de retratar o Ikki. Apesar de fazer o tipo chefão da máfia, ele é um desgarrado, um sujeito que dá as costas ao convívio com os companheiros… Nos filmes de yakuza da Tōei, ele seria um homem como o Kōji Tsuruta e o senhor Ken, que só aparecem após o protagonista levar uma surra violenta, não é? (Risos.)
Além de nunca aparecer no início, ele também não dá as caras imediatamente na sua vez de entrar em cena. Primeiro, ele revela o vulto da Fênix; depois, fora da vista dos espectadores, nos permite ouvir apenas a sua voz… Então, quando os personagens olham na direção da voz, dizemos: “É o senhor Ken!” (Risos.)
Eu quis retratar a figura do Ikki de costas voltadas ao irmão mais novo, partindo depois de deixar um comentário de efeito. Não estender prontamente a mão a um fraco é como a imagem de um leão que bota seu próprio filhote para correr, não é verdade?
Por falar nisso, na (direção da) história final de Mazinger (1972), quando o Mazinger Z virou sucata, revelaram o Great Mazinger. (Risos.)
Ficha
Natural de Ehime, nasceu no dia 17 de março de 1937. Ingressou no mundo das animações na direção de Ken, o Menino-Lobo (1963). Entre seus principais trabalhos figuram produções como os filmes Queen Millennia (1982) e Slam Dunk: Hoero Basketman Tamashii! (1995). Atualmente, tem lecionado no Instituto de Pesquisa da Tōei e na Universidade Kyoto Seika. Kinnikuman II (2002) foi sua última produção.
Seiji Yokoyama — Autor da Trilha Sonora dos 4 Filmes
“(…) por intermédio da música, tentei imprimir a cor que varia em cada produção.”
Fui muito afortunado por contar, até mesmo em filmes produzidos paralelamente à série de TV, com um orçamento superior ao das animações convencionais.
No que tange ao primeiro trabalho, esquematizei os temas dos personagens que apareciam, começando com o Tema de Éris, o Tema de Atena, composição no estilo de ária operística, o Tema de Orfeu, um réquiem de harpa…
Nas cenas do Orfeu, em especial, sofri bastante para produzir o efeito dramático sincronizando a lira que ele tocava e a música incidental.
O segundo filme, A Grande Batalha dos Deuses, que tem a Escandinávia como cenário, possui um som majestoso, entoado por um coro de vozes masculinas na orquestra sinfônica. O terceiro, A Lenda dos Jovens Carmesins, tem uma música no estilo grego, embalada por bandolins.
Com um coro heterogêneo e um sintetizador, utilizei um órgão de tubos para criar a atmosfera divina do quarto filme… Assim, eu tencionava imprimir com a música a cor própria de cada trabalho.
Os meus prediletos são a trilha sonora A Grande Batalha dos Deuses, encetada por um coro masculino, e a trilha sonora intitulada A Lenda dos Jovens Carmesins.
No que diz respeito à performance musical, também foi em Seiya que conheci os membros da seção rítmica, composta por Haruki Mino, no piano, Masaaki Itō, no contrabaixo, Jun Sumida, na guitarra, e Shirō Ito, na bateria. Eles foram uma indicação do senhor Hiroshi Kimura, diretor da antiga Columbia à época.
Além disso, o cosmo flamejante de um grande número de músicos soprou o maravilhoso som que chamamos de alma nas notas musicais que eu criei. E eu lhes sou muito grato.
6/6/2004 — depoimento concedido na residência do compositor
Ficha
Natural de Hiroshima, nasceu no dia 17 de março de 1935. Tem atuado como compositor nas mais variadas searas, trabalhando na televisão, no rádio, em filmes e animações. Entre suas incontáveis obras-primas direcionadas ao público infanto-juvenil estão Uchū Kaizoku Captain Harlock (1978), Kikō Kantai Dairugger XV (1982) e os animes televisivos Saint Seiya (1986) e Gō-Q-Choji Ikkiman (1986).
sagatwin@hotmail.com