“(…) o Shiryu tem uma virilidade franca.”
ENTREVISTA Nº 2 — O DUBLADOR DE SHIRYU DE DRAGÃO
— O senhor poderia nos contar a história de como foi apontado para o papel do Shiryu?
A escolha não se deveu a nenhuma audição específica. Recordo-me de que o papel foi definido quando me disseram algo do tipo: “Tem um personagem assim em uma determinada série, e gostaríamos que você o fizesse”.
— Ao ler o mangá, o que o senhor achou da postura do personagem?
Como não poderia ser diferente, o que senti a princípio foi a amizade entre homens. Acima de tudo, os chamados laços entre homens. Parando para pensar agora, o Shiryu era uma figura que complementava a imagem incompleta de herói do Seiya.
Além disso, o Shiryu tem uma virilidade franca, não é? Quando algo acontecia, ele ainda proferia seu chavão: “Estou preparado para morrer”…
— Como era o estúdio de dublagem naquela época?
Todos os atores principais eram meus conhecidos de longa data. Então, vendo por este lado, a atmosfera do estúdio era incrivelmente leve. Devo dizer que eu recebia bastante ajuda até mesmo na hora de atuar. Para melhorar, os dubladores convidados também eram sublimes. Em vários sentidos, pude experimentar uma tensão fantástica.
— Houve partes que o marcaram enquanto o senhor dublava o Shiryu?
As cenas do Shiryu com o Mestre-Ancião me marcaram profundamente. Afinal, o velho mentor é o bem mais precioso do Cavaleiro de Dragão, não? O cenário no qual o Shiryu se criou transparece até mesmo nas conversinhas com o velho mestre, não é verdade? É por isso que a composição do Shiryu é inconcebível sem a figura do Mestre-Ancião.
— Na época da difusão, o senhor deve ter passado o maior perrengue com o grande interesse dos fãs…
Sim. Como a geração das fãs também mudou em relação à época de Kidō Senshi Gundam, o assédio em datas como o Dia dos Namorados era imenso. (Risos.)
— Quando se fala do Shiryu, penso que a relação dele com o Mu também é memorável…
De fato. O Kaneto Shiozawa, o intérprete do Mu, era meu companheiro de gandaia. Aquele Kaneto era uma peça rara… (Risos.)
Visto que, comparativamente, eu era curto e grosso, essa junção de performances se revelava interessante na hora da dublagem. Como posso dizer, nossos estilos de interpretação são totalmente distintos. Embora eu também seja niilista, o meu niilismo era diferente do dele. O niilismo dele era inquebrantável.
Bem, embora saíssemos para beber depois das gravações, jamais falávamos de dublagem e tal… Eu dizia: “Por essa eu não esperava. Só podia ser você, Kaneto”. Só que ele não tinha jeito e retrucava: “Típico do pequeno Suzuoki”.
É difícil colocar em palavras, mas havia ocasiões em que conseguíamos nos entender por meio dessas sutilezas… Eu realmente sinto que o Mu foi um personagem construído pelo Kaneto.
— Desde aquela época, ouvimos que os atores tinham um grande trabalho de equipe, mas o senhor tem lembranças extrínsecas ao ambiente de gravação?
Sim. Lembro-me bem de eventos como a viagem que fizemos a Shuzenji. Lá, nós nos dividimos em dois grupos, a turma do tênis e a turma do golfe. Embora não pratique mais hoje em dia, como eu estava fissurado em golfe naqueles tempos, joguei umas partidas com atores como o senhor Rokurō Naya, o intérprete do Camus. À noite, os times de golfe e de tênis se reuniam para tomar uma bebedeira.
Pensando bem, como este trabalho tinha um número ínfimo de atrizes, foi um pouquinho solitário… (Risos.)
— Para terminar, gostaríamos que o senhor mandasse uma mensagem aos fãs da série de TV.
Resumindo em poucas palavras, a venda destes DVDs e os novos OVAs são como uma confraternização de ex-alunos. Como os estudantes do ensino médio daquela época hoje viraram adultos atribulados com a criação dos próprios filhos, eu fico exultante ao pensar que essas pessoas estão dando um tempinho nos afazeres domésticos para assistir a estes discos.
Receio que, tanto para os meninos quanto para as meninas que sustentavam Seiya naquela época, os valores e o modo de ver a vida tenham mudado em função das experiências acumuladas nos 15 anos que se passaram até este lançamento. Essas pessoas vão experimentar uma inefável nostalgia ao ver estes DVDs. Nesse sentido, talvez seja uma forma presunçosa de falar, mas creio que estão recebendo um ótimo presente.
Para nós dubladores, também é maravilhoso poder partilhar memórias com os fãs desta forma.
— Muito obrigado.
2003 — entrevista concedida no estúdio de gravação Tavac