O projeto especial que desvendará o mundo irrefreável dos mangás de Kurumada por intermédio de uma entrevista com o próprio mestre Kurumada. Ele nos contou sua história nua e crua, do nascimento às crônicas da vida atual. Dos incontáveis episódios desconhecidos emergirão o passado, o presente e o futuro do mestre. Com o acréscimo de explicações sobre as principais obras e a lista dos trabalhos, são memórias imperdíveis para os masamistas!
Saint Seiya Cosmo Special — Compilação Especial da Shūkan Shōnen Jump, Shūeisha
ONTEM I
“O IMPACTO QUE RECEBI NA PRIMEIRA VEZ QUE VI A OBRA DO MESTRE MOTOMIYA. ISTO É O ‘MANGÁ’!!”
— Correndo na vanguarda da Shōnen Jump desde sua estreia, o mestre Kurumada nasceu em 6 de dezembro de 1953. Trata-se de um menino 100% nascido e criado em Tóquio. Era o filho único numa família de 3 pessoas, mas a Tóquio daqueles tempos ainda estava em meio à reconstrução. O mestre cresceu na época em que o caos do pós-guerra havia passado e a vida das pessoas se tornava próspera. Assim sendo, como terá sido sua infância?
Levando em conta que eram tempos em que não havia coisas de hoje em dia como o Nintendinho, eu brincava em parques e no fundo dos becos e frequentemente alugava livros nas livrarias de aluguel, sabe? Na escola, bem, era um garoto comum, mediano nos estudos, e também arrumava brigas…
Quanto ao boato de que eu seria chefe de uma gangue nos tempos de estudante, é uma grande mentira que o meu editor na época da estreia contou… (Risos.) O que aconteceu foi apenas eu ficar dando uma de bad boy por um tempo.
No que se refere a clubes, como comecei a fazer judô aos 15 anos, eu entrei no clube de judô, mas acho que só treinei para valer no primeiro ano do ensino médio… (Risos.)
— É na época de menino que começamos a pensar no que vamos ser no futuro. Na vida cotidiana, também foi nessa época que o senhor se encontrou com os mangás. Como ocorre com todos, no início, era apenas um apreciador de mangás. Mas, depois, foi um pouquinho diferente…
Como eu gostava de mangás desde criancinha, eu lia bastante. Por volta da terceira ou quarta série, eu gostava de Iga no Kagemaru e de obras como Tetsuwan Atom. Iga no Kagemaru, em especial, foi a que me deixou mais impressionado, sabe?
Entre as antologias de mangás, acho que era a Shōnen, não? Pois, para a época, era uma revista incrivelmente refinada. Depois, a partir dos tempos do ginasial, era o gekiga das livrarias de aluguel.
Sendo justo na época em que as livrarias de aluguel vivenciavam o boom do gekiga, o senhor Takao Saitō, o senhor Mitsuyoshi Sonoda e outros autores famosos até hoje estavam desenhando, mas eles caminhavam na extrema vanguarda. Já que os desenhos arredondados do mangá estavam perdendo a graça, ou melhor, parecendo infantis, as técnicas do gekiga, a exemplo da composição e tal, projetavam uma imagem tremendamente inovadora.
Então, ao ver na Shōnen Jump o trabalho do mestre Hiroshi Motomiya, eu fui impactado. Eu pensei “Isto é o mangá!?…” De fato, por serem tempos em que a Shōnen Jump ainda não era semanal, eu a vi por acaso numa casa de lámen… (Risos.)
De qualquer forma, a imagem explosiva desenhada em cores nas páginas opostas de abertura, no frontispício, tinha um apelo incrível. É por isso que, caso não tivesse visto a obra do mestre Motomiya, talvez eu não tivesse pensado em me tornar um autor de mangás, sabe?
— O encontro com o mangá de um grande senpai finalmente fez o senhor pegar a caneta. A jornada até a glória do mangaka Masami Kurumada começou aí. Por volta da época da formatura no ensino médio, houve a tentativa de enviar um trabalho. Em seguida, o dia a dia de assistente estava à espera do senhor.
Desde pequeno, eu desenhava uns arremedos de mangá em papel de palha (rascunhos); do tipo que todo mundo faz, mas acho que desenhei usando caneta, em papel de desenho, só um pouco antes da graduação no ensino médio. Entretanto, sem saber o jeito de desenhar, acontecia até de eu desenhar com tinta azul… (Risos.)
Como acabei de dizer, no meu caso, o choque recebido do gekiga e do mestre Hiroshi Motomiya meio que virou meu mundo de ponta-cabeça; não é desenhar de forma detalhada nem construir histórias afiadas; em suma, eu tinha o pensamento de que o mangá seria bom se fosse interessante. A aspiração de virar mangaka enquanto desenhava um mangá era igual a querer entrar nos Giants porque caras como o Nagashima e o [Sadaharu] Ō estavam lá, ainda que esses não sejam jogadores de beisebol de antigamente.
Ou seja, eu queria ser como o mestre Motomiya. Então, no terceiro ano do ensino médio, havia na Shōnen Jump um concurso chamado “Prêmio Young Jump”, o predecessor do antecessor do “Prêmio Hop, Step and Jump”, e eu experimentei mandar o primeiro trabalho que eu havia concebido para lá. Quando o desenhei, eu estava pensando “Não existem pessoas que consigam desenhar tão bem quanto eu” e tal, mas nem na lista dos bons trabalhos ele entrou. (Risos.)
Presenteando o público com as comoventes crônicas do amadurecimento de um homem de verdade, Otoko Ippiki Gaki Daishō também foi a primeira obra da Jump a ser convertida em anime, em 1969
Assim, fui ao departamento editorial e, ao perguntar o porquê, parece que isso depois se espalhou como um “assalto de tropas inimigas”. (Risos.) Então, a pessoa da edição que fez o favor de me receber disse que, por acaso, estavam faltando assistentes em Samurai Giants, série da qual estava encarregada, e acabou me chamando para o trabalho.
Então, pela primeira vez, passei a trabalhar como assistente de um profissional. Se não estou enganado, acho que foi por volta de novembro, na iminência da minha formatura, na primavera.
ONTEM 2
“SUKEBAN ARASHI: COMO OS LÍDERES DE DELINQUENTES ESCOLARES ERAM COMUNS NA ÉPOCA, TROCAMOS O PROTAGONISTA HOMEM POR UMA MULHER.”
— O senhor passou do amadorismo para o mundo dos profissionais num pulo. No período de sua jornada de amadurecimento marcial, em que apostou na juventude, o mestre Kurumada tem várias experiências. Mesmo assim, enquanto estava assoberbado a ponto de os olhos de assistente girarem, a estreia como profissional estava cada dia mais próxima…
Naquela época, tudo era realmente novo para mim; até virar assistente, eu nem sabia o que era retícula… (Risos.) e, ao conhecer o processo de aplicar o vegetal (papel vegetal para tracejado) sobre o croqui finalizado, lembro de ter tido a impressão de que era algo muito suntuoso: “Isto é o croqui puro mesmo!?”
Onipresente nos mangás, a retícula é uma técnica de finalização que consiste na impressão de texturas por decalque nos croquis. Hoje o processo é feito de forma digital
Depois, também cometi presepadas… Num mangá de beisebol, na parte em que a torcida fica gritando, ao pensar que não teria problema, eu acabei trocando arbitrariamente o grito “Uooon!” por “Uooo!” (Risos.)
O mestre ficou surpreso, mas, considerando que era uma boa pessoa, não ficou bravo; contudo, ele disse: “Mesmo estando escrito no rascunho…”(Risos.)
Assim, enquanto continuava no posto de assistente, ao desenhar os trabalhos incansavelmente, eu os levava ao departamento editorial. Como estava louco para sair de casa logo, já por volta dessa época, eu aluguei um apartamento na região de Shakujii, ficando independente. Na perspectiva dos meus pais, eles provavelmente pensaram que, mesmo saindo de casa, eu não ia conseguir nada e logo voltaria, sabe? (Risos.)
Entretanto, quanto ao aluguel e despesas do tipo, uma vez que a grana obtida somente como assistente era totalmente insuficiente, eu também fazia trabalhos de meio período.
Então, estreei com Sukeban Arashi na época em que tinha 20 anos. Foi uns 2 anos e meio depois que comecei como assistente?… Cambaleando, eu fui ao departamento editorial para entregar o manuscrito que desenhei a altas horas da noite, nos intervalos entre o trabalho de assistente e os demais.
“FOI O CHOQUE RECEBIDO DA OBRA DO MESTRE HIROSHI MOTOMIYA QUE ME IMPELIU NO CAMINHO DE AUTOR DE MANGÁS.”
— Um novo mangaka de sangue quente nasceu no universo de mangás shōnen. Sukeban Arashi começa, e os leitores marcam a ferro em suas consciências o autor dessa história poderosa. E, mais importante, como a prova de sua primeira vitória, a obra de estreia tornou o senhor um autor muito difícil de esquecer.
Na verdade, Sukeban Arashi é uma obra que originalmente teria um homem no papel de protagonista. Ainda por cima, os trabalhos que eu enviei antes também eram todos de líderes de gangues estudantis. Como era de se esperar, eu tinha sempre em mente o desejo de desenhar um mangá como Otoko Ippiki Gaki Daishō, do mestre Motomiya. Mas, como as obras de escolas de garotos estavam na moda, eu, relutantemente, fiz o homem ter a imagem de uma mulher… (Risos.) E, também, eu tinha o sentimento de querer estrear na Shōnen Jump o mais rápido possível, mesmo que fosse um pouquinho.
Em contrapartida, se pudesse mostrar o apelo dos mangás do Motomiya, e um ambiente leve fosse acrescentado, além de um belo toque que fosse apreciado também pelas garotas, intuí que, na qualidade de obra, também seria como adicionar um porrete de aço à imagem de um ogro. Eu ponderei que seria ótimo se tanto os leitores quanto as leitoras mirins fossem à loucura com o mangá. Então, como a maior parte das cartas de fãs também era de garotas, eu pensei se não tinha saído exatamente como imaginei.
Não apenas ficou popular mas, durante o período de publicação, até conseguiu o primeiro lugar no concurso entre os leitores. Entretanto, posteriormente, por ter ficado difícil obter papel devido à influência da Crise do Petróleo naquela época, o número de páginas da revista diminuiu. Com isso, a serialização foi encurtada e finalizada. Como podem imaginar, não dá para esquecer a frustração que senti na época.
SUKEBAN ARASHI Rei Kōjinyama é uma estudante do primeiro ano do ensino médio do colégio Himejō, numa província casteleira. Apesar de ser mulher, é uma menina superlevada que brande um nunchaku, mas, no fundo dessa postura tosca, se oculta a inocente (simples?) dona de um coração ardente. A mãe de Rei faleceu quando ela era pequena, e a garota vive com seu pai, um pedreiro, e sua irmã mais nova, Mika.
Na obra de estreia do autor — que retrata com meio toque de comédia-pastelão a adolescência de amor e brigas que Rei, seu companheiro de lutas, o chefe de gangue Tokusaburō Ōkōchi, seus colegas de classe e outros delinquentes descortinam —, a vitalidade da protagonista, incomum para uma mulher (?), se converte em desenhos com todo o seu apelo, explodindo nas páginas.
— Depois da obra de estreia, o fascínio das dinâmicas novelas kurumadianas foi ficando mais intenso. A obra na qual ele desabrochou imensamente e resultou num grande sucesso foi a seguinte, Ring ni Kakero. Foi quando começaram os tempos áureos do hit-maker Masami Kurumada.
Talvez a frustração com o término de Sukeban Arashi tenha sido a força motriz de Ring ni Kakero. Na época em que estava desenhando este trabalho, a partir do meio da serialização, sem pensar em nada relacionado ao boxe em si, eu só fui perseguindo uma coisa: como desenhar para deixar os leitores extasiados. Em suma, nos mangás nekketsu, fazer o leitor achar a obra interessante repousa na intensidade da empolgação que você provoca.
É por isso que, nesse ponto, mesmo as lutas já transcendem o boxe e são praticamente algo como batalhas entre os Irmãos Ultra… (Risos.) Contudo, acho que assim está bom e, se parar para pensar no que são meus mangás, foi com isso que eu cheguei até aqui, certo?
Mas, seja quem luta neles um boxeador, um ninja, um chefe de gangue durão ou heróis parecidos com os da mitologia grega, podemos dizer que esse tipo de coisa é um tema de todos. Com isso, a parte em que mais sofri em Ring ni Kakero, continua sendo a mesma coisa hoje, foi no “nome” (falas). O nome é mesmo a vida dos mangás.
Na Shōnen Jump, até este aniversário de 20 anos, não há mais que 40 ou 50 trabalhos cuja serialização ultrapassou o capítulo 50, tamanha é a dificuldade da sobrevivência. Então, tendo compreendido isso, não tem como eu me resignar com a concepção de um nome meramente satisfatório. Afinal, ao criá-lo, fico pensando que perderei de lavada na votação semanal dos leitores…
“SE NÃO DEIXA OS LEITORES EXTASIADOS, NÃO É MANGÁ. A OBRA QUE DESENHEI BASEANDO-ME NESSA CRENÇA FOI RING NI KAKERO.”
Devo matutar e matutar até o limite; tenho que bolar algo superior a tudo que fiz até hoje. Ring ni Kakero, naturalmente, também foi assim, mas penso que o presente só existe porque sempre vim trabalhando desta forma desde o passado.
RING NI KAKERO
A primeira série genuína de artes marciais, o trabalho que estabeleceu o estilo de desenvolvimento característico dos dramas de Masami Kurumada. O garoto Ryūji Takane, que despertou para seu talento no boxe graças aos ensinamentos da durona Kiku, sua irmã mais velha, finalmente se torna o Campeão Júnior do Japão e, junto com 4 rivais atados pela amizade, vai esmagando um desafiante após o outro.
A priori, era um mangá de boxe, do chamado gênero esportivo, mas, para fazer frente ao surgimento de inimigos grandiosos, a exemplo do clã Shadow e do time dos 12 Deuses da Grécia, explodiram técnicas de supersocos como o Galactica Magnum, e os quadrinhos ficaram muito famosos. A obra é o protótipo de Saint Seiya.
— Depois de Ring ni Kakero, o tornado Kurumada também soprou violentamente. Quando se engajou em sucessivos novos temas com Fūma no Kojirō e Otokozaka, deu origem a um conjunto de obras ardentes que não parava de mandar o sopro de vida imutável dos “homens” para os leitores. Mas, em seu âmago, havia uma composição à qual o mestre consagrou todo o seu coração e alma, uma escrita que parecia tingida de sangue.
No mundo dos mangás, há um ditado sobre a segunda obra: “A obra posterior a um grande sucesso não emplaca”. De fato, quanto maior é a popularidade do trabalho anterior, para os autores de mangá, maior é a pressão sobre a obra seguinte. Falando de outro ângulo, é que também há o fato de ser avaliado nessa segunda obra se a força do autor é genuína ou não. Mesmo no que tange a mim, havia uma terrível gana para fazer algo ainda melhor que Ring ni Kakero na próxima obra.
Quando a serialização terminou, eu tinha um estoque de 3 obras novas: uma era Fūma no Kojirō, uma era Otokozaka e a outra era um mangá de sumô; contudo, como realmente não parece que o conteúdo de sumô faria sucesso, mesmo hoje, não tenho vontade de desenhá-lo… (Risos.)
No fim das contas, por poder fazer uso da parte mais deliciosa de Ring ni Kakero, optei por Fūma no Kojirō. Sintetizando, embora a temática de Ring ni Kakero seja o boxe, o que estou fazendo são combates surreais, certo? Eu os retrato lutando com luvas em cima do ringue; em Fūma no Kojirō, eles apenas estão lutando fora e vestindo uniformes escolares. É por isso que digo que o que estou fazendo não muda muito. (Risos.)
FŪMA NO KOJIRŌ
Em declínio por causa da inescrupulosa Seishikan, a Academia Hakuō, uma famosa instituição de artes marciais, utiliza a força de Kojirō, um jovem do clã Fūma, para se opor à concorrente. Kojirō, que recebeu de Ranko Yagyū a espada sagrada Fūrinkazan, se bate com Musashi Asuka, o rival da Seishikan, mas, com o surgimento de Caos, um inimigo ainda mais poderoso, é envolvido junto com Musashi na Competição das 10 Espadas Sagradas, que segura o destino do mundo.
Tratava-se de uma série popular na qual o pano de fundo ninja é adicionado à ação estudantil; contudo, uma vez que a narrativa se transfere para a “guerra das espadas sagradas”, o drama se desenvolve numa escala universal. Entrou no domínio monopolizado pelas novelas kurumadianas.
RAIMEI NO ZAJI
Uma série única entre as obras kurumadianas, não se trata de uma serialização, e sim de uma sequência formada por 3 one-shots publicados. Zaji, o protagonista, é uma arma humana forjada até o extremo pela enigmática organização secreta Tumba Branca (Lar), um guerreiro de primeira classe. Contudo, ao se voltar contra a organização e escapar, ele continua sua jornada de perambulação solitária.
Com os embates contra os poderosos executores enviados pela Tumba Branca — a exemplo de Kei, do Canhão Destruidor, e de Zoro, do Traje de Aço — consistindo no clímax de cada episódio, o formato de capítulos especiais casa perfeitamente com os duelos mano a mano.
De todos os heróis concebidos pelo mestre Kurumada, talvez possamos dizer que este seja o mais solitário.
Assim, inevitavelmente, Otokozaka se tornou o trabalho que sucedeu a Fūma no Kojirō, mas, para mim, esta foi uma obra pela qual eu estava obcecado a ponto de pensar “Eu virei um mangaka porque queria desenhar isto!” Sendo uma obra que eu sempre quis fazer desde os tempos de moleque e também desde que estreei como profissional, nesse sentido, eu realmente desenhei feliz. Mas o resultado foi insatisfatório… (Risos.)
ONTEM III
RING NI KAKERO, QUE VISAVA UNICAMENTE O ENTUSIASMO DOS LEITORES, E OTOKOZAKA, O OTOKO IPPIKI GAKI DAISHŌ AO ESTILO DE KURUMADA
Então, se fosse forçado a dizer por que Otokozaka acabou com uma vida curta, em poucas palavras, é que eu queria desenhar o meu próprio Otoko Ippiki Gaki Daishō, mas o fato é que Otoko Ippiki é Otoko Ippiki somente porque o mestre Motomiya o retrata, não é? O sentimento de querer superar essa obra?… É provável que esse tipo de pretensão tenha me impregnado e, por causa disso, a pospelo da expectativa, não tenha ido bem.
OTOKOZAKA
Com os arranjos do estilo kurumadiano, é uma série incompleta que segue o padrão consagrado no qual, ao conquistar companheiros atados pelo sangue quente, um garoto que não fica atrás de ninguém quando o assunto é coragem e força bruta finalmente chega ao topo de todos os homens do Japão.
Recebendo as técnicas secretas da briga do lendário Demônio das Lutas, Jingi Kikukawa começa a escalar a longa e mortificante ladeira dos homens. Quem se interpõe em seu caminho é Shō Takeshima, o chefe do leste do Japão, e ainda a JWC (Junior World Connection).
Batendo-se com inimigos de todo o mundo, Jingi tenta integrar os caras durões do Japão, mas… O ortodoxo drama masculino consiste numa impressionante saga nekketsu.
HOJE
“OS PROTAGONISTAS DE SAINT SEIYA FORAM CONCEBIDOS EM DIFERENTES TIPOS: SEIYA É ESQUENTADINHO, SHIRYU É SÉRIO, E HYOGA É FRIO.”
— Uma obra mais chamejante, ainda maior… O indômito espírito afeito a desafios do mestre finalmente produziu um mangá de ação nunca visto antes. Sucedendo a Otokozaka, Saint Seiya, graças a seu fascínio sem paralelos, viu sua popularidade começar a subir às alturas de imediato.
O conceito de fazer da mitologia grega a base da história foi algo inserido a partir do meio do caminho. Quanto ao conceito inicial de “Seiya”, a série deveria ter começado de um ponto mais simples. Eu estava pensando em fazer um conteúdo de caratê juvenil, como no filme Karate Kid.
Eu achava que seria maneiro um conteúdo de caratê com o acréscimo de faíscas voando… (Risos.) Então, no caso de sujeitos com esse incrível poder, se não tivessem vestimentas protetoras, o corpo deles provavelmente não aguentaria o tranco… Em face disso, pensei nas armaduras sagradas.
De qualquer forma, a priori, eu também estava pensando nas profundezas de uma montanha do Japão como cenário e foi por causa do estado em que o capitão e a manager — que estavam fazendo um camping do clube de caratê bem ali — encontraram o Seiya, que havia despencado… (Risos.) Mesmo no briefing com os editores, houve a reação de que aquilo era um pouco exagerado… (Risos.)
Embora eu cogitasse que o lugar no qual os cavaleiros treinam podia até ser o Japão, parece mesmo fora de lugar, não é? Neste caso, pensei que, se fosse a Grécia, encaixaria perfeitamente, não é verdade? Mas, como existe uma espécie de adágio na indústria que diz que o trabalho não será muito bem recebido se usar o estrangeiro como cenário, na verdade, eu não era lá muito fã dessa ideia… (Risos.)
“CAVALEIROS, ARMADURAS, SEIYA… EM ‘SEIYA’, SENTI NA PELE O QUÃO IMPORTANTE É A TERMINOLOGIA.”
A princípio, o título também não era “Saint Seiya”; eu queimei a cabeça com títulos como “Ginga no Rin” e afins. Mas concluí que não eram lá muito bons. “Guerreiro Sagrado” [Seisenshi: 聖戦士], que pensei em seguida, já era meio comum. Foi então que eu bolei “Santo Lutador” [Seitōshi: 聖闘士]. Optei por esse termo porque, mesmo se lendo “santo” [seinto], combina com a pronúncia do japonês.
Também é por esse motivo que, de início, “Seiya” [星矢: Flecha Estelar] era “Seiya” [聖矢: Flecha Sagrada]. Contudo, pensando que era bonito demais para o nome de um protagonista… (Risos.) eu troquei os ideogramas.
— Saint Seiya não é apenas uma compilação dos romances kurumadianos; a obra contém um grande número de ideias novas, a exemplo das armaduras sagradas. Vendo nela uma nova amplitude, que suplanta os mangás anteriores de Kurumada, os leitores apaixonados também foram se multiplicando num átimo. Assim, Masami Kurumada agora virou um autor de mangás na crista da onda.
Quando o protagonista foi decidido, os outros personagens foram determinados naturalmente. Como o Seiya era do tipo esquentado, um seria sério: Shiryu, um seria frio: Hyoga. E, junto com um do tipo bonitinho, o Shun, um do tipo lobo solitário, o Ikki. Acho que os nomes também combinam bastante… (Risos.) Quanto a caras como o Jabu, eu pensei que poderiam se envolver mais na história, pois, basicamente, a personalidade deles parece com a do Seiya.
Depois, as indumentárias dos protagonistas também… De início, queimei a cabeça pensando em nomes como “estola budista” [kesa: 袈裟]… (Risos.) mas, depois que o pano de fundo da Grécia foi adicionado, mudou muito. No fim das contas, sendo as túnicas sagradas que revestiam os corpos na era mitológica, ficou decidido que a designação “pano” [cloth: 聖衣 — “armadura” no Ocidente] era a melhor.
Também nessa época, senti claramente que o mangá realmente é o “nome” (terminologia). Então, seguindo agora para a fase de elaborar concretamente as armaduras, eu passei por maus bocados por não entender muito de coisas de anime, a exemplo de artefatos de ficção científica, mas o editor responsável disse que a ideia de ficar com a forma de um cavalo ao ser aglutinada e tal era absolutamente incrível… (Risos.)
Na verdade, fui eu que pensei se isso não era impossível… (Risos.) Portanto, além de, no início, não estar definido que o Seiya possuiria a armadura de Pégaso, também não estava definido o que faria ao obtê-la.
Embora esta também seja uma ideia não utilizada, também havia até um cenário segundo o qual, sendo filho do dono de um dojo de Shitamachi, ao voltar para casa, ele encontraria seu pai assassinado por alguém… (Risos.)
Mas, uma vez que o cenário foi decidido por meio desse processo, como as constelações basicamente estavam no alicerce do conceito, embora também tenha sido assim com coisas como a corrente do Shun de Andrômeda, no caso de aparatos como armas e armaduras, creio que não tive muitos problemas quanto ao resto.
AMANHÃ
“JÁ ESTARÁ PASSANDO DE BOM SE ACHAREM O TRABALHO AO QUAL DEVOTEI TODAS AS FORÇAS DO MEU CORPO E ALMA VAGAMENTE INTERESSANTE NA HORA DE LER.”
— O encontro com os mangás do passado resultou nas obras-primas do presente e, doravante, um futuro ainda mais grandioso está para se abrir para os mangás de Kurumada. Os leitores devem estar certos do surgimento de uma obra excitante com ainda mais fascínio, superando até mesmo “Seiya”, considerada o zênite. Isto é entretenimento! O fato é que Masami Kurumada é um autor que não sabe enfastiar as pessoas.
Falando dos desdobramentos futuros de “Seiya”, como disse agora há pouco, levando em conta que a mitologia grega está na fundação da história, creio que continuarei a expandi-la dentro desse universo. Além disso, mesclando nela outras mitologias variadas, entre outras coisas, talvez eu conceba uma série de one-shots.
No entanto, não importa o quanto Saint Seiya seja popular agora, além de a competição entre as obras na Shōnen Jump ser encarniçada, jovens autores de mangá vão surgindo rapidamente, certo?
Uma vez que, para ir vencendo neste meio, digam o que disserem, a arma mais possante é o poder da obra, o longo tempo que você está desenhando mangás, as boas histórias que você fez por meio da criação de “nomes” mais esmerados que os das outras pessoas… os grandes feitos que você realizou não significam nadica de nada na Shōnen Jump… (Risos.)
Como conseguir manter o poder da obra semana após semana e tirar da cartola ideias novinhas em folha? Mesmo que por uma vez, quando uma obra não desabrocha na Shōnen Jump, o desafio de fazer uma flor desabrochar outra vez é muito difícil. É por isso que estarei perdido se um novo rosto que supere meu jeito de trabalhar aparecer… (Risos.) Talvez eu sinta que é hora de parar quando isto acontecer.
Matutando sobre esses fatos, a única coisa que posso dizer sobre os mangás é que, mesmo que você os desenhe, se não puder entrar em seu mundo, é o fim.
Os jovens provavelmente conseguem fazer isso porque, na juventude, não importa o que façam, eles não se sentem plenos… Então, ficar no mundo da lua é mais divertido e, quando se passa a gostar desse tipo de coisa, também é mais fácil penetrar no mundo dos mangás. Afinal, o mangá se traduz num universo de fantasias. (Risos.)
É para aqueles que têm gozado de uma vida plena e também para os que chegam à divertida fase adulta que entrar nesse mundo se torna difícil. De fato, o peso da vida real é maior que o faz de conta.
Nesse sentido, para mim, também existe o aspecto de que Ring ni Kakero foi feito somente com o ímpeto da minha juventude, ao passo que estou fazendo “Seiya” com a técnica. É que, nos tempos de Ring ni Kakero, eu desenhava de forma mais passional, algo como “Se você se aproximar, eu passo a espada”. Em contrapartida, se em “Seiya” também houvesse mais esse fator do “olho do tigre”, é provável que tivesse se transformado numa obra completamente diferente.
Mas, ao infundir essa vontade numa obra, você sempre tenciona transmitir uma mensagem pessoal através do mangá, e eu não estou com esse tipo de coisa em mente. Já estará de bom tamanho se apenas o lerem de forma simples, com interesse.
Colocando de uma forma bem extrema, se você achar o meu mangá interessante enquanto o lê no metrô, ao chegar à estação, pode jogá-lo no lixo! — eu me atreveria a dizer isso. Afinal, o mangá nada mais é do que uma recreação. Além de pensar que o fato de a tiragem da Shōnen Jump ter crescido até este ponto desde sua estreia também foi porque a publicação compreendeu bem esse ponto de vista, isso também coincide com a minha política pessoal. Creio que, daqui para frente, a despeito do tipo de mangá que for desenhando, apenas isso não mudará.
— Os sonhos que o mestre Kurumada retrata não têm fim. E a ingênua confiança depositada no mangá de que é possível transformar todos eles em realidade faz a caneta do mestre correr esplendidamente. Ontem, hoje e também amanhã… Enquanto houver mangá neste mundo, vamos dizer com segurança que as novelas kurumadianas serão imarcescíveis.
“Há sonhos que só podemos ter porque estamos na infância. O fato é que podemos ter sonhos que não conseguimos mais experimentar quando acabamos nos tornando adultos. Sim, as crianças são capazes de se fundir com as nuvens que percorrem calmamente os píncaros do céu azul! E eu quero continuar retratando esses grandes sonhos.”
(Excerto do posfácio de Mabudachi Jingi.)
— Grandes sonhos se traduzem nas próprias novelas de Kurumada. As pessoas que leem os mangás do mestre sabem disso melhor do que ninguém.
SAINT SEIYA
É uma série famosa que não há hoje em dia alguém que desconheça, e a escala majestosa com que converteu a mitologia na estrutura da história a faz digna de ser chamada de representante das novelas kurumadianas.
Nas crônicas dos cavaleiros, guerreiros divinos que têm combatido para proteger a Terra desde tempos imemoriais, o quinteto de Seiya, a elite dos jovens reconhecidos como cavaleiros de bronze, se reúne sob a égide de Saori Kido, a encarnação de Atena. Contra o diabólico Grande Mestre, que controla o Santuário, na Grécia, e contra a ambição de Posseidon, eles travam heroicas lutas de morte.
A obra magna, um trabalho repleto de ideias únicas, a exemplo das armaduras.